Era um dia triste e cinzento. A garoa fria incomodava quem precisava estar na rua. Forçando-se a ter coragem, João fechou um pouco mais o casaco e atravessou a porta de casa, ganhando a calçada.
Aquele era o dia da semana que menos gostava de ir trabalhar. Se pudesse pagar e não ir, pagaria. Era o dia em que os vendedores vinham à sede da empresa prestar contas. Dia de aturar choradeiras a respeito de metas muito altas. De enfrentar os espertalhões de sempre, que tentavam bater suas metas através de "jeitinhos" pouco éticos, como incluir mercadorias não solicitadas nos pedidos, contando com o prazo de devolução ou o descontrole dos clientes para dar a meta por batida.
Mas, pior que tudo, era o dia de encontrar o Alexandre.
Alexandre, Xande para os amigos, havia sido colega de escola de João. Anos depois, os dois se reencontraram, agora colegas de empresa, João trabalhando na parte administrativa e Xande como vendedor. Tido como um dos melhores da equipe, não poupava elogios a si mesmo. E nem poupava João de suas brincadeiras. Na época da escola, namorara uma menina por quem João nutria uma paixão secreta. Um confidente indiscreto fez a noticia chegar a Xande e este nunca mais deixou de torturar João com a história, na escola ou na empresa. Todos a conheciam. E todas as semanas, Xande a contava novamente. Mas não hoje. Hoje seria diferente.
Quando percebeu que Xande estava se aproximando, João saiu de sua mesa. Circulou, parou em algumas mesas, entrou na sala de xerox e ficou por lá algum tempo. Ao voltar, aproximou-se de Xande e o convidou para tomarem um café. Aceito o convite, foram até a cafeteira. João serviu duas xícaras e deixou que Xande escolhesse a sua. Assim que o colega começou a bebericar o café, disparou:
- Eu sei que você tem agido de maneira inadequada a um bom funcionário. E hoje eu vou provar isto.
Xande quase engasgou com o café, mas conseguiu se recompor e fingir calma, ao perguntar:
- Eu, agindo de maneira inadequada? O que você quer dizer com isto?
- Espere e verá.
Aquilo acabou com toda a alegria de Xande. Não teve ânimo para rir de João, ou para fazer gracejos às funcionárias, ainda que se esforçasse por demonstrar tranqüilidade.
Alguns momentos depois, com a chegada do supervisor de vendas, todos se dirigiram à sala e a reunião teve início.
E começou como sempre começava, com uma preleção do supervisor a respeito do total de vendas esperado e do atingido, da necessidade de um maior comprometimento dos vendedores com a meta, de como atingir as metas previstas é importante para o crescimento de todos... Todas as semanas as palavras eram praticamente as mesmas. João sequer prestou atenção ao que estava a ser dito, já conhecia o discurso. Além disto, aquelas palavras não lhe diziam grande respeito, naquele momento. Ao invés de ouvi-las, sua atenção se concentrava em Xande, que a cada momento demonstrava estar um tanto mais agitado. E João sequer preocupou-se em disfarçar.
Em seguida às palavras do supervisor, começou o que João chamava a “fase da choradeira”, momento em que cada vendedor explicava as ocorrências de suas visitas e procurava justificar eventuais pedidos ainda não fechados.
Junto com a “choradeira”, haveria o “puxão de orelhas”, com a orientação individual do supervisor ao vendedor que estivesse se explicando. E algum eventual aparte de João, informando a respeito de eventuais reclamações por pedidos com itens não solicitados pelos compradores. Era um momento tenso. De uma maneira geral, o supervisor fechava os olhos à prática, pois sabia que alguns clientes acabavam por ficar com os produtos e, embora uma prática desonesta, não deixava de ser uma venda a mais. Também ele dependia de ver as metas batidas. Mas se começasse a haver reclamações seguidas de algum cliente, o vendedor responsável poderia ser demitido.
Ao preparar a planilha, João intencionalmente havia deixado Xande por último. Conforme avançavam os vendedores, a agitação de Xande era cada vez mais perceptível. Ao chegar sua vez de falar, ele mal conseguia parar na cadeira, e aparentava mesmo estar esverdeado.
Quase vomitou as palavras, ao apresentar a posição de seus pedidos, de uma maneira geral todos fechados, apenas uma ou outra pequena pendência simples de resolver.
Também o supervisor teve poucas observações a fazer a Xande, o que não o surpreendeu. Sabia que era raro alguém encontrar algum problema em suas vendas. Mas não tirava os olhos de João, que demonstrava uma calma e descontração muito maiores do que as usuais.
O supervisor terminou de falar, perguntou a João se havia algo a acrescentar e, para a surpresa de Xande, este disse que não. A reunião foi encerrada. Todos saíram da sala, Alexandre mais rápido que de costume. Não se deteve para as costumeiras brincadeiras e conversas com os outros vendedores. Não combinou almoço com ninguém. Apenas desapareceu.
Alguns momentos depois, João encontrou-o no corredor.
- Viu como eu provei que você anda agindo de maneira inadequada?
- Não vi nada! Ou vi que você enlouqueceu de vez, isto sim. Como eu sabia, o supervisor não fez crítica alguma ao meu trabalho. E você não abriu a boca na minha vez. O que provou? O que tem para me acusar?
- Continuo dizendo que você age de maneira inadequada para um profissional e que eu provei isto. Não é nada ético ficar mexendo nas gavetas das pessoas sem autorização, e muito menos pegar coisas dessas gavetas. O chocolate que você roubou da minha gaveta e comeu tinha laxante.
Aquele era o dia da semana que menos gostava de ir trabalhar. Se pudesse pagar e não ir, pagaria. Era o dia em que os vendedores vinham à sede da empresa prestar contas. Dia de aturar choradeiras a respeito de metas muito altas. De enfrentar os espertalhões de sempre, que tentavam bater suas metas através de "jeitinhos" pouco éticos, como incluir mercadorias não solicitadas nos pedidos, contando com o prazo de devolução ou o descontrole dos clientes para dar a meta por batida.
Mas, pior que tudo, era o dia de encontrar o Alexandre.
Alexandre, Xande para os amigos, havia sido colega de escola de João. Anos depois, os dois se reencontraram, agora colegas de empresa, João trabalhando na parte administrativa e Xande como vendedor. Tido como um dos melhores da equipe, não poupava elogios a si mesmo. E nem poupava João de suas brincadeiras. Na época da escola, namorara uma menina por quem João nutria uma paixão secreta. Um confidente indiscreto fez a noticia chegar a Xande e este nunca mais deixou de torturar João com a história, na escola ou na empresa. Todos a conheciam. E todas as semanas, Xande a contava novamente. Mas não hoje. Hoje seria diferente.
Quando percebeu que Xande estava se aproximando, João saiu de sua mesa. Circulou, parou em algumas mesas, entrou na sala de xerox e ficou por lá algum tempo. Ao voltar, aproximou-se de Xande e o convidou para tomarem um café. Aceito o convite, foram até a cafeteira. João serviu duas xícaras e deixou que Xande escolhesse a sua. Assim que o colega começou a bebericar o café, disparou:
- Eu sei que você tem agido de maneira inadequada a um bom funcionário. E hoje eu vou provar isto.
Xande quase engasgou com o café, mas conseguiu se recompor e fingir calma, ao perguntar:
- Eu, agindo de maneira inadequada? O que você quer dizer com isto?
- Espere e verá.
Aquilo acabou com toda a alegria de Xande. Não teve ânimo para rir de João, ou para fazer gracejos às funcionárias, ainda que se esforçasse por demonstrar tranqüilidade.
Alguns momentos depois, com a chegada do supervisor de vendas, todos se dirigiram à sala e a reunião teve início.
E começou como sempre começava, com uma preleção do supervisor a respeito do total de vendas esperado e do atingido, da necessidade de um maior comprometimento dos vendedores com a meta, de como atingir as metas previstas é importante para o crescimento de todos... Todas as semanas as palavras eram praticamente as mesmas. João sequer prestou atenção ao que estava a ser dito, já conhecia o discurso. Além disto, aquelas palavras não lhe diziam grande respeito, naquele momento. Ao invés de ouvi-las, sua atenção se concentrava em Xande, que a cada momento demonstrava estar um tanto mais agitado. E João sequer preocupou-se em disfarçar.
Em seguida às palavras do supervisor, começou o que João chamava a “fase da choradeira”, momento em que cada vendedor explicava as ocorrências de suas visitas e procurava justificar eventuais pedidos ainda não fechados.
Junto com a “choradeira”, haveria o “puxão de orelhas”, com a orientação individual do supervisor ao vendedor que estivesse se explicando. E algum eventual aparte de João, informando a respeito de eventuais reclamações por pedidos com itens não solicitados pelos compradores. Era um momento tenso. De uma maneira geral, o supervisor fechava os olhos à prática, pois sabia que alguns clientes acabavam por ficar com os produtos e, embora uma prática desonesta, não deixava de ser uma venda a mais. Também ele dependia de ver as metas batidas. Mas se começasse a haver reclamações seguidas de algum cliente, o vendedor responsável poderia ser demitido.
Ao preparar a planilha, João intencionalmente havia deixado Xande por último. Conforme avançavam os vendedores, a agitação de Xande era cada vez mais perceptível. Ao chegar sua vez de falar, ele mal conseguia parar na cadeira, e aparentava mesmo estar esverdeado.
Quase vomitou as palavras, ao apresentar a posição de seus pedidos, de uma maneira geral todos fechados, apenas uma ou outra pequena pendência simples de resolver.
Também o supervisor teve poucas observações a fazer a Xande, o que não o surpreendeu. Sabia que era raro alguém encontrar algum problema em suas vendas. Mas não tirava os olhos de João, que demonstrava uma calma e descontração muito maiores do que as usuais.
O supervisor terminou de falar, perguntou a João se havia algo a acrescentar e, para a surpresa de Xande, este disse que não. A reunião foi encerrada. Todos saíram da sala, Alexandre mais rápido que de costume. Não se deteve para as costumeiras brincadeiras e conversas com os outros vendedores. Não combinou almoço com ninguém. Apenas desapareceu.
Alguns momentos depois, João encontrou-o no corredor.
- Viu como eu provei que você anda agindo de maneira inadequada?
- Não vi nada! Ou vi que você enlouqueceu de vez, isto sim. Como eu sabia, o supervisor não fez crítica alguma ao meu trabalho. E você não abriu a boca na minha vez. O que provou? O que tem para me acusar?
- Continuo dizendo que você age de maneira inadequada para um profissional e que eu provei isto. Não é nada ético ficar mexendo nas gavetas das pessoas sem autorização, e muito menos pegar coisas dessas gavetas. O chocolate que você roubou da minha gaveta e comeu tinha laxante.
16 comentários:
Querido pensador!
Ao ler teu conto que gostei muito pensei nos 10 mandamentos.claro que não os vou dizer aqui todos.não se assuste.
Não matar, não Roubar, não cobiçar a mulher do outro I já se for a mulher a cobiçar o homem da outra, tem mil anos de perdão).
Então se o Xande, não tivesse roubado não teria sido apanhado com as calcas na mão.
Por vezes meu amigo, basta uma palavra, como se diz, apanhar verdes para se comer maduras.
O medo ele terrível, mesmo que não se tenha feito nada, o medo atrapalha a vida das pessoas.
Principalmente daquelas que vivem se preocupando demais com o umbigo delas, eu cá como sou extraterrestre não tenho umbigo e não tenho medo.
Mil beijos e continua a escrever assim que quando fores grande serás um escritor, ah, só que tens muito pra crescer ainda, tadinho, és um lindo menino, tempo de ir dormir, se não amanha eu recebo um telefonema de tu a me tratares mal
Mil beijos em ti e na tua lobinha linda, e querida
Rachel
Meu Pensador,
Bonito seu texto!
Por vezes não são as palavras as melhores aliadas a apanhar alguem desprevenido...mas sim aquilo que fica por dizer....sem duvida alguma que deixa o outro numa situação(se tiver para isso)constrangedora.
Eu gosto desse jogo!!!Aliás posso te dizer que gosto mesmo é de aplica-lo...até mesmo quando nada sei....mas acaba sempre sendo uma maneira de saber logo!!!
Bjinho cheio de luar
Está com um desfecho engraçado, por inesperado.
mas que Xande andava aprontando alguma, isso andava...senão não teria enverdecido.
Um bom dia para si e para a sua Loba.
Olá meu querrido amigo.
Pensador:
Olha adorei seu texto, muito criativo e ao mesmo tempo nos prova que nesse mundo ainda existem e muitos desonestos por ai.
Que esse texto sirva de reflexão aos desonestos.
Beijinhos doces a vc. e a sua loba.
Uma semana de muita paz, amor e luz.
Regina Coeli.
Rachel, querida amiga,
Quando o escrevi, não pensei nos 10 mandamentos. Pensei apenas em tantas pessoas que encontramos pela vida, sempre prepotentes, considerando-se os melhores, atropelando todos o tempo todo e achando que isto é a maneira correta de viver.
Sim, joguei com a história do medo. Medo por algo errado que fez, e que piorou, para o Xande, o efeito do laxante. Medo quie pode ser o pior veneno para a vida de uma pessoa.
Quanto a ser um grande escritor quando crescer, duvido muito. Ainda me falta muito chão...
E você bem sabe que nem eu e nem a Loba jamais a trataríamos mal.
Um grande beijo, meu e do meu amor!
Moonlight,
As palavras são grandes aliadas. Melhor ainda quando passamos a compreender seu significado oculot, e podemos controlar, ao invés de sermos controlados.
Um beijo e um uivo!
São,
Com certeza, ele havia aprontado as suas. E não apenas as que se gabava...
Imagino mesmo que tenham trombadinhas por aí. Apenas não sei que nomes lhes dão.
Beijos!
Regina,
Obrigado pelos elogios.
Quanto ao personagem, eu diria que o Xande encarnaria bem o triste "jeitinho brasileiro", que deveria desaparecer em favor de atitudes mais éticas.
Beijos, e bom final de semana prolongado!
Meu Amigo
Passo para ler te e deixar a ti a tua Loba um beijo grande e meu desejo de muito amor pra vcs
Beijinhos a vcs
Não tolero mentiras...
Gostei demais de seu texto!
Beijos e bom feriado!
*para você e sua doce Loba!
Biazinha
que história incrível, mas se pensarmos bem, ela bem q poderia ser verdadeira.
Tenhas um lindo fim d semana,
bjs
Boa Noite
Passando para desejar a vcs um ótimo final de semana, sempre com muito amor e muito carinho
Beijinhos
Querido, Amigo pensador,
Hoje venho de muito longe
Tão longe, que demorei pra aqui chegar
Trago mil beijinhos e abraços, todos para te dar.
Ando cansada, acho que hoje me vou aqui deitar
Se a loba me dá licença, me empreste seus braços para me aconchegar.Prometo ser uma boa wicca, e so seus braços usar. ihihiih.
Desejo que a tua semana seja rios de alegria
E que as pontes nunca caiam
Pra que eu não tenha que voar e sim possa simplesmente caminhar
Mil beijos em ti e em teu doce e querido amor.
Rachel
Feiticeira,
Gosto muito de sua visita no meu cantinho.
Desejo-lhe uma semana de felicidades, e que possa caminhar para uma boa resolução de seus "dilemas". Da maneira que lhe for melhor.
Beijos!
Bia,
Existe uma coisa que eu acho complicada, chamada "mentira social", que infelizmente quase todo mundo pratica, mas não deveria. É quando, por exemplo, o chefe pede para dizer que ele não está, ou está em reunião, para não atender a um telefonema. Horrível e difícil de fugir delas.
Um grande beijo, e boa semana!
Mariana,
De certa forma, a história é verdadeira, pois contém pontos de diversas histórias reais, das quais tive conhecimento ou presenciei.
Boa semana!
Rachel,
Por maiores que sejam as distâncias, você está no nosso coração. E, sempre que precisar de um descanso, sabe que pode contar com a toca dos lobos. Aqui, ninguém vai incomodá-la, sob o risco de levar umas mordidas.
E as pontes não cairão, pois são feitas de diamante, do mais sólido diamante que existe no universo: A verdadeira amizade.
Uma boa semana, com muitos beijos, meus e do meu amor.
Nem tudo o que parece é , certo?!
Adorei o teu texto, Pensador... por todo o lado, há pessoas assim.
Um beijo de carinho para ti e para o teu amor.
Amigo Pensador
Obrigada por tuas palavras tão carinhosas
Desejo que tua semana seja de muito amor e que logo tua Loba esteja pertinho de ti e ai juntinhos leiam mais uma vez o post da Rachel e .....
Beijinhos aos amigos
Secreta,
De fato, nem tudo é o que parece. O problema é que também não podemos nos deixar levar por isto, pois muitas vezes as coisas são o que parecem, e não queremos ver.
Graça,
Infelizmente, esta é uma face negra do ser humano que é bastante comum.
Um beijo carinhoso meu, e da minha Loba!
Feiticeira,
Não vejo a hora de estar junto à minha Loba. E, neste momento, a Rachel que me desculpe, mas acho que a última coisa que vamos pensar é mesmo em ler posts, rsrsrs.
Pode ter a certeza de que você tem todo o nosso carinho, e que a vemos como uma amiga querida.
Beijo, e boa semana!
Pensador,
Que coisa chata essa de trabalhar em um a empresa assim, tem sempre o mais engraçadinho ou a mais engraçadinha querendo ser melhor.
Um abraço!
Alcides
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